Sou Maria Aparecida Nunes Barbosa da etnia Xacriabá. Moro na aldeia Barra do Sumaré II, município São João das Missões, Minas Gerais. Sou professora há 15 anos na minha aldeia. Sou estudante universitária da UFMG.

Há 3 anos que faço pesquisa sobre conflitos e sobrevivência do povo Xacriabá e municípios vizinhos, antes dos anos 1970.

Pensei em criar esse blog para divulgar meu trabalho e de outros colegas e dar oportunidade para outras pessoas conhecerem um pouco sobre as histórias do nosso povo, que a maior parte está só na mente dos mais velhos que eles estão levando com eles.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Conflitos


Na entrevista de seu Adelino, ele fala que antigamente, quando os índios xacriabá não tinham contato com os brancos, não tinham nenhuma confusão entre os índios, tinha muita união, tudo que tinha era dividido entre eles. A desunião começou depois do contato com os brancos .
 “Não, não tinha não. Os índios, de premeiro, não tinham a confusão que tem hoje. Os índios, de premeiro, tinha confusão com o pessoal de fora. O pessoal de fora que eles não conheciam. Até com o pessoal de fora, qualquer coisa eles brigavam, porque eles estranhavam aquele povo. Eles não consideravam o povo de fora igualmente ao povo da tribo; ali era um grupo, aquele grupo era reservado. Agora chegava uma pessoa de fora, que às vezes fosse amigo de um que quisesse o bem, então se ele agradasse um, estava agradando todo mundo e se ele desagradasse um, desagradava todo mundo. E hoje não está assim, o pessoal hoje já não está assim, o pessoal hoje já tem aldeia aí que inimigo já briga um com o outro. Às vezes, por causa de pessoas de fora, que coisa, tem horas que dá mais apoio a uma pessoa de fora, e misturou tudo, isso aí não está sendo bom igual era não, porque aquele não está preservando o grupo, igualimente era não.
O índio não tinha confusão com o pessoal de fora, aí de um tempo pra cá foi misturando, depois dos posseiros pra cá foi que teve essa revolta, índio contra índio, contra os de fora também, tá igual, a briga com os de fora está sendo por mesmo motivo. Hoje já não tá um grupo separado igualimente era não. De muito deferençou, não sei por que rendeu, mas o pessoal estava misturado com os branco, porque na época  os índios viviam fora do branco, era os grupos, só era índio no grupo do índio, hoje está tendo mais branco do que índio”. (Seu Adelino, 67 anos, aldeia Itacarambizinho)
A mistura de negros que veio da Bahia gerou conflito também por causa das diferenças,tinha costumes culturas  deferente.
"Pra misturá veio pessoal que não era índio, veio de Bahia, veio de Cochá, veio de vários lugares misturando com os índios. Chegava ali, os índio, o índio ia agradando aquele grupo ali, os índio já passava a ser amigo. Naquilo foi misturando, aí depois que misturou, outros chegava pra saber notícia da área. Já vinha era assim". (Seu Adelino, 67 anos, aldeia Itacarambizinho)
 “Gaspar chegaria afirmar o desaparecimento futuro dos índios, dão a invasão sempre crescente dos mestiços, oriundos dos português e africanos.’’ (p 29 do Relatório de Ana Flávia)
“O premeiro fazendeiro foi Juca Martizão, foi o primeiro que comprou terreno até dos lado. Vendeu assim de lá daquela grotona lá, ó! Perto no brejinho pra cá não podia, aí era o nosso terreno. Aí quem combateu foi o finado Rodrigue e compadre João também combateu, que foi sempre eles.  Essas vendas de terras que deu briga e deu morte.” (Dona Guardina,  58, aldeia Barra do Sumaré)
“Em alguns causo eles obrigava vender e se não vender, eles tomava”, como fala na entrevista do finado Rodrigues no relatório de Ana Flavia, p 70.
“Aí eles pegaram e jogaram um tanto de gado dentro das rocinhas, e foi rebentando tudo o que a gente tinha, e aí depois Iaiá ajudou, Iaiá, a onça, a Iaiá Cabocla nossa. Ela deu uma sangrada num bocado aí, bebeu o sangue e largou só um montão de folha, matou um bocado, eles assobiaram ô e saiu e cascou debaixo, saiu de repente, pegou o gado e saiu tudo, porque aqui, se a pessoa não souber, ela acontece mesmo é! E depois foi virando essa briga entre os povos, uns entraram e acompanharam, outros não acompanharam. Depois acabou dessa forma. Os posseiros eram os mais ricos e os remanescentes eram os mais pobres”. ((Dona Guardina,  58, aldeia Barra do Sumaré)
Seu Adelino conta que a confusão maior foi a que o CIMI entrou e incentivou os índios a expulsarem os fazendeiros das terras, causou muitas mortes. Antes já tinhas conflitos  com os fazendeiros por vários motivos, como quando colocava roças e quando estava madura, os fazendeiros passavam cerca adentro e colocavam gado para comer, porque as roças dos índios de primeiro não tinha cerca. Aí ia questionar e causava brigas ou cercava o terreno e proibia os índios a não passar dentro. Às vezes, o caminho estava dentro do terreno que eles cercaram. Assim afirmam  D. Guardina e Seu Adelino.
Seu Emílio falou que os conflitos internos que sempre aconteciam entre os xacriabás eram quando tinha um mau entendido e uns davam fins nos outros, de um modo que ninguém dava fé, matava e dobrava e colocava dentro de um pote e guardava. Como conta seu Emílio, confusão maior que tinha era assim:
“A não ser aqueles que eram os maldosos, que enrechava com eles, esses enterrava cá mesmo, dobrava e colocava no pote. Índio mesmo e branco que entrava, eles pegavam e davam remédio para embebedar, aí dobrava e colocava dentro do pote com o fundo pra baixo, mas eram os que queriam invadir. E os que andavam também batendo com a língua nos dentes, eles faziam assim também. Se visse, tinha que ficar calado. Esses eram os crimes mais perigosos que tinha de primeiro”. (Seu Emilio, 59 anos, aldeia Pedra Redonda)
Mas tinha muitas diferenças de uma aldeia para outra porque não foi todas as aldeias que foram invadidas pelos fazendeiros. Em muitas aldeias as brigas que aconteciam eram assim:
“O povo bebia cachaça, tombava para lá, às vezes brigava de murro de cacete. Mas no outro dia ia lá pedir desculpa para o outro: “- Êta cumpadre, desculpa, como foi que aconteceu isso, cumpadre? Foi porque nós bebemos demais.” Ninguém brigava por terra ou por outra coisa”. (Seu Emilio, 59 anos, aldeia Pedra Redonda)
Outro tipo de conflito eram os massacres de viajantes que saiam para resolver problemas da terra e os fazendeiros colocavam tocaia no caminho e arrastavam em cavalos pela estrada, muitos morriam porque machucavam muito e não tinha médico, só remedios do mato, como o  relata  no relatório de Ana Flavia.

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