Sou Maria Aparecida Nunes Barbosa da etnia Xacriabá. Moro na aldeia Barra do Sumaré II, município São João das Missões, Minas Gerais. Sou professora há 15 anos na minha aldeia. Sou estudante universitária da UFMG.

Há 3 anos que faço pesquisa sobre conflitos e sobrevivência do povo Xacriabá e municípios vizinhos, antes dos anos 1970.

Pensei em criar esse blog para divulgar meu trabalho e de outros colegas e dar oportunidade para outras pessoas conhecerem um pouco sobre as histórias do nosso povo, que a maior parte está só na mente dos mais velhos que eles estão levando com eles.

terça-feira, 12 de abril de 2011

ENTREVISTA COM O SENHOR PEDRO COSTA BARBOSA

ENTREVISTA COM O SENHOR PEDRO COSTA BARBOSA
Idade: 73 anos.
Município: Manga. Fazenda Altamarindo.

  • COMO ERAM AS CONDIÇÕES DE VIDA DAS PESSOAS ANTES DOS ANOS SETENTA?
É, nesse tempo, a gente andava de carro de boi e carregava as coisas na carga. Aqui tudo era difícil, não era bom do povo viver não, nem estrada não tinha, só tinha carreiro. Não tinha arroz, pisava era milho para fazer o canjicão, e tirar o fubá, o trem era pesado.

  • COMPRAVA? TINHA SALÁRIO, COMO QUE ERA?
Não, não tinha salário não. O salário tinha assim 50 centavos. No tempo, eu dizia assim: “Deus, me ajuda que eu ganho o menos uns 50”. Deus me ajudou que eu ganhei dois mirreizin na roça, trabalhando para os outros para ganhar o pão, era difícil, não era fácil não.

  • PRA COMPRAR AS COISAS TINHA VENDA POR AQUI?
Não, não tinha venda não. Pra comprar só na Iúna ou Itacarambi ou Manga. Ia à cavalo e tocando o jegue pra trazer as coisas. Levava algodão, mamoma e porco gordo, vendia para trazer as coisas, era tudo difícil. Não tinha estrada, na época era só uns carreiros, o povo não saía pra fora como hoje, não tinha instrução, o pessoal só trabalhava aqui na roça, só dentro de casa, aqui mesmo na cidade, aqui mesmo para comprar alguma coisa não tinha instrução como hoje para ir pra firma, São Paulo, não tinha não.
O povo ia daqui em Januária de pé, ai, ai! Eu mesmo, quantas vezes eu não fui de pé, tocano carquinha de arroz,  dormia na estrada. Hoje nem pra comer não está dano.

  • COMO ERA, TINHA DOCUMENTO DE PRIMEIRO?
Eu mesmo não me lembro de documento não. Eu, quando fui tirar já estava grandão, nem sabia, porque não tinha cartório, só na Inhuma, num Arnaldo Velho. Aí, com uns tempo, esses meninos meu, foi que compadre Conde deu uma andada por lá e foi tendo conhecimento com o velho Arnaldo e deu pra levar cartão com o nome das crianças, casamentos, aí foi que foi parecendo, antes era tudo parado.
Hoje eu agradeço o meu pai e minha mãe que me criou. Nem na escola eu não fui porque não achei oportunidade, fiquei só dentro de casa trabalhando. Os meus irmãos entrou na escola e eu fiquei, sem estudo não aprendi nada, o estudo que meu pai me deu foi, meu pai dizia: “olha, menino, quando você for num lugar, você anda direito, não fica mais a meninada não”. Eu ia e ficava no meio dos velhos, formava um balaio de gato, “não este aqui não, vai pra lá”, eu dizia olha se eu estivesse lá!

  • OS PROFESSORES GANHAVAM ALGUMA COISA?
Os professores que eu estou falando nessa época era os pais dos alunos que pagava, agora não sei quanto.

  • ANTIGAMENTE TINHA BRIGA, ROUBO, COMO HOJE?
Não, de premeiro era sossegado, tinha muita união. De premeiro, de noite encontrava uma pessoa, já conhecia a voz, aí conversava, era aquela maior amizade do mundo. Hoje, quando encontra já esta com medo.

  • AS ROÇAS ERAM COMO HOJE?
Não, de plantação não batia negócio de veneno não, tratava a roça a poder do braço, botava e limpava, veneno foi de pouco tempo.
[Quando ia colocar uma roça, a outra ainda estava sem colher, a fartura era muita. Nas festas tinha as festas, as sala rica, quando brigava, brigava ] (FALA DE OUTRA PESSOA)
Era de murro, não era de faca não. As coisas hoje diferençou demais, pra trazão não era assim não, uma doença miorava com um chazinho, já hoje não miora não. Diferençou demais.
O movimento de vida de primeiro era bom demais, os casamentos de primeiro era no padre ou no civil, casava era no padre, ia pra missa, chegava lá casava. De premeiro as pessoas casava só pela a amizade dos velhos. A festa de Cezário cortou o dia até no outro dia até 10 horas. Hoje namora 3 anos, quando casa ainda não dá certo.
Eu não reclamo de minha vida, molhando de noite, carriando no escuro que nem um breu. Já carriei com uma vara de boi, que ia naquele mundo, Deus e eu. 

  • O SENHOR CARRIAVA ERA COISA DE ROÇA?
Era carriando coisa de roça que eu ia levando lá pro velho Ogenio Lepe, para vender. Era sofrido. Era milho, algodão e momona.

  • O QUE PLANTAVA?
Na época, eu plantava milho, feijão, algodão, feijoa, tudo plantava e tudo saía, o clima da terra era mais sadio. Lumiava com caburãozinho de barro com óleo de momona, depois de um tempo eu lembro que apareceu querosene e as candeia, os povo lumiava de caroço de momona enfiava um no outro num talo e lumiava como uma vela. Tinha também a candeia de cera. Quando as mulheres ganhavam neném passava no umbigo era o azeite, o povo era sadio, já hoje mudou, é uma mordomia que não pode pisar no chão. Meu irmão chega aqui e tira o sapato para pisar na terra para pegar energia para melhorar os nervos. 

  • ÁGUA DE PRIMEIRO ERA SÓ NO RIO?
Era no rio, grota, cacimba de rio, só tinha esse aqui, eu já panhei muita água em cacimba. Para por roça, fazia os mutirão, eu mesmo sai daqui pra ajudar José de Cristina, trabalhava que nem umas máquinas, era saúde, tinha muita energia.

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