Sou Maria Aparecida Nunes Barbosa da etnia Xacriabá. Moro na aldeia Barra do Sumaré II, município São João das Missões, Minas Gerais. Sou professora há 15 anos na minha aldeia. Sou estudante universitária da UFMG.

Há 3 anos que faço pesquisa sobre conflitos e sobrevivência do povo Xacriabá e municípios vizinhos, antes dos anos 1970.

Pensei em criar esse blog para divulgar meu trabalho e de outros colegas e dar oportunidade para outras pessoas conhecerem um pouco sobre as histórias do nosso povo, que a maior parte está só na mente dos mais velhos que eles estão levando com eles.

terça-feira, 12 de abril de 2011

ENTREVISTA COM SEU LIFA

ENTREVISTA COM SEU LIFA
Idade: 86 anos
Aldeia: Sumaré 3

  • O SENHOR SABE COMO COMEÇOU A ORGANIZAR OS DOCUMENTOS PARA DEMARCAR A ÁREA? O SENHOR CONHECEU A PESSOA A QUE FOI O PRIMEIRO A DAR INÍCIO?
É, de premeiro era assim, era de escritura, depois largou ela porque essa área aqui era para deixar para os índios, mas todo mundo tinha as terra, era tudo de escritura, aí depois foi que voltou, mó de esse direto que deu, aí foi que acabou esse negócio de escritura, esse negócio ficô para a FUNAI, eu me lembro bem, não era para pagar mais imposto nem nada, antes pagava né! Pagava! Se não pagava num ano, ano outro tinha que pagar, falou que não era para pagar mais imposto, porque essa área que era o governo que estava dando, mas também foi assim todo mundo pagava e não tinha nada, ai depois inventaram que tinham uma barra de ouro dentro de uma lapa, ai desgramemos a cavacar, estoremos esse morro seis meses, um ano, seis de outro, e nunca que apareceu, mas o trem estava lá dentro, assim teve um que entrou e viu ele lá dentro e saiu cum cacho de banana desse tamanho, panhou e falou com os outros que não ia cavacar mais não, que ia descansar e dar um tempo. Esse que panhou era mais proca.
O governo deu essa área foi nessa era (risada), se fosse nessa era agora!... Nesse tempo eu era menino, assim ó! Meu pai carregava eu era para amarrar cavalo, dar água, mas sempre eu ia lá assuntar, foi cavando, cavando pra lá assim numa curva, desse tamanho assim ó! “Me dá uma rapadura pra Ninim levar, pra mim comer”, aí deu ele a rapadura, ele comeu, bebeu água, ainda deu uma para ele levar. Se fosse uma gente esperta tinha saído, tinha malinado, tinha rastado ele, estava lá, conversando mais o véio, ele chegou cedo e quando ele saiu já foi de tarde. Tinha dado tempo de guardar o ouro. Não dava! Aí chegou lá, ganhou essa taxa. Se fosse como esse de agora, pequeno não, de premeiro vendia era por saco. Tinha bastante, era grande, era pequeno.

  • PARA REGISTRAR O DOCUMENTO DA TERRA, O SENHOR SABE QUEM DEU INÍCIO?
Quem deu inicio, eu não sei não, nesse tempo eu era pequeno, era menino. Só sei que tinha Manelão Paixão e Pedro Geromo que arrumava, o Pedro Geromo só era para arrumar, que ele não tinha leitura, o bom mesmo para viajar era o Manelão, ele morava no Barreiro.

  • AQUI TINHA MUITOS FAZENDEIROS?
Os fazendeiros que tinha aqui era um homem que morava aqui, o finado Iôiô, que morava ali naquele morro perto de Zé de Ermina. Ele comprou essa terra na mão dele e ele foi comprar outra terra lá no Dizimeiro. O homem que vendeu a terra para o finado Iôiô é de fora, é fazendeiro que antes tinha comprado terra aqui. 

  • COMPRAVA REMÉDIO, QUAIS?
Nesse tempo não comprava muito remédio não, só comprava na butique era: rual, cena, aguardente camelão, maná. De premeiro não tinha esse tanto de doença não, quando parecia, já tomava esses remédio e já melhorava, hoje parece tantas doenças que a gente nem sabe o que que é.

  • DE PRIMEIRO OS ÍNDIOS ERAM TODOS APURADOS?
No início era todos apurados, mas depois foi ficando muito misturado, mas foi por aldeia, lá na Prata mesmo tinha uns índios todos branco, mas do cabelo bom. E era assim, umas aldeias era mais misturada e outras mais apurada. Mas tudo era daqui.

  • E QUAIS ERAM OS TIPOS DE ALIMENTOS?
Antigamente era carne de gado, porco, caça do mato, tatu, anta, caititu, e criava tombém carneiro. Os alimentos era assim.

  • QUAIS ERAM OS ALIMENTOS DE ROÇA? O QUE PLANTAVA?
Plantava arroz, feijão e milho. Arroz plantava nos baixão e o milho plantava onde água não passava, mas era uma fartura! Quando ia plantar, que chegava o tempo, ainda tinha na roça, outra hora fazia um surrão para guardar de um ano para outro, o surrão era para guardar milho, feijão, arroz, momona e algodão, e o sote era para guardar farinha, carne, toicim. 

  • COMPRAVA ALGUMA COISA FORA?
Não, fora o café e o sal, assim mesmo comprava era de prato e de quarta. De primeiro era tudo no prato, momona, feijão, os cortador de gado vendia um quarto, pegava no meio e pegava uma vara e marcava no meio e marrava uma corda e botava um pedaço em uma ponta, outro na outra ponta e quando o peso estivesse igual, o quarto estava dividido no meio. Assim era feito com pedaço pequeno e a balança de primeiro era assim. Chamava fieli. Pesava tombem no fieli saco de algodão, momona e paina. Metro e quilo é de pouco tempo. E de quando inventou quilo, as coisas arruinaram, ficou tudo difícil. Momona, algodão e paina era levada na cabeça para Januária para vender, para trazer as coisas que não tinha cá.
De primeiro quando ia casar uma moça, fazia o cochão era de palha de milho, banana e folha de caitinga de porco para pôr na cama da noiva. E trabiceiro era feito de paina. E era considerado coisa granfina.

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